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As memórias de infância. Os cheiros, as vozes, as emoções de um tempo em que o tempo não tem fim e o significado está presente nas mais pequenas coisas. Todas elas ficam para sempre, como marcas na alma, princípios que norteiam a vida.

 

A nostalgia dos lugares mágicos da infância. De Alma, vila encantada onde convive tradição e subversão, melancolia e audácia, crendices, ideologia e futebol. Pela voz audaciosa de quem não receia dar-se a conhecer, chegam-nos os ecos de um Portugal dividido entre a República e a Monarquia, um país que era, à época, o mundo de uma criança expectante e atenta. De Alma, partiu toda a sua vida.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Porque tudo se passava numa terra mágica, num tempo mágico. A terra e o tempo da infância, da descoberta encantada de si mesmo, dos outros e do mundo. E que terra era essa, que tempo? Só podia ser Águeda e os últimos anos de escola. Quando na Europa havia guerra e cá dentro uma paz podre, que era uma outra forma de guerra.

 

Mas bem vistas as coisas, aquela terra e aquele tempo eram a raiz e o ritmo da minha própria alma. Uma Águeda que já não existia. Ou que era só Alma. E que por ser Alma não morrerá nunca. Sim. Aquela terra era uma terra única. Porque era a minha e nela se tinha formado a minha própria alma. Mas também podia ser qualquer outra terra, à beira de um rio, naquele tempo, em Portugal. Era uma terra única, irrepetível. Mas era também uma terra-todas-as-terras. E por isso Alma. Talvez a alma de Águeda. A minha própria alma.

E talvez seja esse o segredo do livro. Talvez seja o que explica que em menos de vinte dias a primeira edição se tenha esgotado e que muita gente me diga que se revê naquela casa, naqueles personagens, naquela escola, naquele rio. Ou seja: naquela terra de província de um Portugal parado no tempo.

(...)

 

Alma é Águeda que já não é e que não sendo continua a ser. E os personagens, que o Jorge Silva Pinto, como grande aguedense, descodificou, são aquelas pessoas e não são. Ou são elas e são já outras, porque são personagens e, por isso, são pura invenção, reinvenção, transfiguração.

Seja como for, eu tinha de escrever este livro. Há livros que se fazem porque se quer. Há outros que se escrevem porque não pode deixar de ser. Foi o que aconteceu com Alma. Era a raiz e a matriz.

Muitas vezes, nas horas do exílio e da solidão, eu agarrava-me à memória, sobrevivia das minhas próprias raízes. Como Ulisses pensando em Ítaca perdida, também eu pensava num rio, numa rua, numa casa.

 

Não sei se alguém consegue voltar de um longo exílio. Não sei se alguma vez se volta verdadeiramente a casa. Nem sei tão pouco se alguém, a não ser, como na Odisseia, o fiel porqueiro de Ulisses, verdadeiramente nos reconhece quando voltamos. Talvez Alma fosse a única maneira de voltar à minha terra, à minha casa, ou a mim mesmo. Talvez a única forma de finalmente ser reconhecido pelos que já cá não estão, pelos que nunca me conheceram e pelos que só assim poderão saber quem sou. Ou quem não sou. Sabe-se lá.

 

Excerto da intervenção de Manuel Alegre no lançamento da 1ª edição de Alma, Águeda, 19 de Janeiro de 1996.

Explicação de Alma, por Manuel Alegre:

Conversas Improváveis com Manuel Alegre e José Cid:

Trova do Vento que Passa declamado por Manuel Alegre acompanhado por Carlos Paredes:

País de Abril dito por José Mário Viegas:

Comemoração dos 50 anos do livro Praça da Canção:

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